Esta semana tive a oportunidade a ouvir a participação de Ryan Carson no The Rocketship Podcast, um dos vários podcasts de empreendedorismo que acompanho. Podes ouvir o episódio aqui. A inspiração foi tanta que decidi escrever um artigo.
Carson é o fundador da Treehouse, uma empresa que quer mudar o mundo. O que me fascinou foi como essa mudança começa, realmente, na organização e na forma como encara o trabalho. Mas já lá vamos.
O que é a Treehouse?
A Treehouse é uma escola online onde se pode aprender linguagens de programação (como HTML, CSS, Ruby ou PHP), WordPress e até Gestão.
A sua grande missão é conseguir formar profissionais à distância, no prazo de 6-12 meses.
Novos cursos são adicionados frequentemente, ficando a biblioteca cada vez mais rica. O que mais aprecio é o facto de podermos visualizar o Roadmap, para ter uma ideia do que vem a seguir. É um toque de transparência que aprecio.
O utilizador pode optar entre 2 planos (o Básico, que custa $25/mês e o Pro, que são $49/mês) e ao se juntar à comunidade, ganha acesso a todos os cursos e exercícios, que deverá frequentar para coleccionar emblemas, ou badges.
Estes emblemas são basicamente um diploma, a recompensa de completar os vídeos de um tópico (com durações muito variáveis, alguns temas são 45 minutos, outros 20 horas) e já são reconhecidos por empresas como a LivingSocial, que pede os badges quando está a recrutar.
Existe claro uma versão “experimental”, de 14 dias, com acesso gratuito e ilimitado a todos os conteúdos.
Ainda não tive a oportunidade de experimentar esta plataforma, visto estar a guardar essa oportunidade para Dezembro, mas a priori não parece ser diferente de tantos outros players neste mercado, como o Udemy, Lynda.com ou o SkillShare, apesar de estar aplicado a algo mais específico.
A análise ao produto propriamente dito terá de ficar para outro artigo – o que pretendo dissecar hoje é a mentalidade do seu fundador e, consequentemente, da empresa. A cultura poderá ser o grande factor de diferenciação desta marca face às restantes.
Como tudo começou
A Treehouse não é a primeira empresa de Ryan. Na verdade, Carson tinha fundado uma empresa (de nome Carsonified) em 2004 com um objectivo semelhante: formar web designers e programadores, sobretudo através de eventos.
Essa empresa foi vendida em 2011 porque Ryan sentia que não estava a chegar a pessoas suficientes – estava a chegar a milhares, não a milhões, e a sua visão era mais ambiciosa que isso.
Nesse ano, Carson pegou na plataforma de vídeo da sua antiga empresa e deu-lhe o nome Treehouse por reflectir “o fascínio de aprender enquanto criança”. E a verdade é que a empresa não parou de crescer desde então, passando de 3 empregados para mais de 75 (!) no curto espaço de 3 anos.
O que torna a Treehouse diferente?
Esta empresa tem um conjunto de características que se torna muito apetecível para trabalhadores, traduzindo-se em satisfação e qualidade/eficiência no trabalho.
Vamos conhecê-las.
#1: Na Treehouse trabalha-se 4 dias por semana
Nesta empresa, as semanas de trabalho são de 32 horas e não se trabalha à 6ª feira.
Quando questionado sobre a possível desvantagem de ter menos 20% de tempo do que os seus concorrentes para apresentar trabalho, Ryan apresenta algumas vantagens que justificam esta abordagem:
- O recrutamento é facilitado, visto que o salário é pago na mesma por inteiro;
- A retenção dos bons colaboradores é maior, por naturalmente estarem mais felizes na Treehouse;
- Sobra mais tempo para as pessoas estarem com a família ou dedicarem-se a outro hobbies (mais 50% que a maior parte das pessoas).
Carson acredita que o trabalho de informação não é o mesmo que trabalho de fábrica e que não se pode quantificar pelas horas. As pessoas têm de ser inteligentes a gerir o seu tempo. E a verdade é que este horário das 9 às 18 de 2ª a 5ª não impediu a Treehouse de crescer rapidamente, de atingir o lucro e de ganhar mais investidores.
#2: Na Treehouse trabalha-se em qualquer lado
A maior parte dos colaboradores são dos EUA, mas Ryan estava até há bem pouco tempo no Reino Unido. Optou por regressar à América devido ao fuso horário, mas grande parte da equipa está ainda espalhada pelos vários estados, trabalhando remotamente.
Trabalhar remotamente não é novidade (a empresa Buffer é outro bom exemplo) mas é sempre bom saber que cada vez mais empresas encontram formas de operar sem pedir aos colaboradores que desperdicem 1 hora (ou mais) do seu dia no comboio ou no carro.
Também à semelhança do que acontece na Buffer, na Treehouse toda a equipa viaja até Orlando 4 vezes por ano, durante 4 dias, com o objectivo de interagir cara-a-cara com os colegas e participar em actividades lúdicas.
#3: Na Treehouse não há chefes
“Os chefes estão tão ocupados a comunicar mensagens, resolver problemas e gerir carreiras, que acabam por raramente fazer o que importa: pensar e actuar para o cliente.” Pelo menos, é esta a experiência de Carson.
Como se isso não bastasse, a satisfação dos colaboradores estava a ser inversamente proporcional ao crescimento da empresa.
A Treehouse estava a tornar-se numa daquelas empresas – e Ryan não podia permitir que tal acontecesse.
Assim, no fórum interno (que todos os colaboradores têm acesso), Ryan colocou na mesa a ideia de terminar as chefias. A ideia foi encarada ao princípio com algum receio, mas também com muito entusiasmo.
Feita a votação, os resultados não enganavam: 90% das pessoas queria experimentar esta nova abordagem.
Sendo assim, como surgem os resultados?
Com esta alteração, deixaram de existir projectos “aborrecidos”. As pessoas passaram a escolher o que queriam fazer em vez de serem obrigados a tal.
Em cada ano, Ryan estabelece com o seu fundador Alan Johnson 4 ou 5 objectivos absolutamente prioritários sem dar qualquer indicação de como os alcançar. Os colaboradores são incentivados a ter ideias e a actuar enquanto CEO da empresa, em vez de verem 5 pessoas a ditar o rumo da empresa e seguirem ordens.
Para uma ideia ser aceite, é preciso que esta reúna um conjunto de interessados em seguir esse caminho. Essa dinâmica explora não só a criatividade e proactividade dos colaboradores, como aumenta o sentimento de integração, obrigando-os a encontrar uma forma de “vender” as suas ideias aos restantes colegas.
O próprio CEO admite que esta mudança não foi para todos – existem pessoas que preferem uma chefia e objectivos claros – mas que foi a decisão certa.
#4: Na Treehouse, existe (real) meritocracia
Depois de cada projecto, os colaboradores avaliam os seus colegas.
Os empregados podem ter 3 tipos de consequências: uma avaliação acima do resultado pretendido (que se traduzirá num aumento do salário), uma avaliação à altura do esperado (ficando tudo na mesma) e um aviso, no caso de ficar aquém das expectativas.
Se o conjunto de avisos se acumular, os empregados terão de apresentar um plano no prazo de 1 semana mostrando o que pretendem fazer para alterar a situação e, passado 1 mês, têm de apresentar resultados (ou serão dispensados).
Esta é uma excelente forma de compensar quem realmente merece e de dar uma oportunidade a quem não está à altura de trabalhar para mudar a situação.
#5: Na Treehouse, a comunicação é diferente
Tal como Thomas Knoll, Ryan não é fã do e-mail.
Em parte, por ser pouco eficiente e adicionar passos desnecessários aos processos. Mas sobretudo por ser um sistema de conversação privado e querer que na Treehouse a comunicação seja pública e acessível por toda a equipa.
Ryan não recebe mais de 10 e-mails da sua equipa, por dia. Certamente uma realidade bem diferente de muitos CEOs.
A equipa comunica diariamente no programa de chat HipChat, tem um fórum interno (de nome Convoy) e um software de gestão de projectos intitulado “Flow”. Ryan descreveu os processos e as várias ferramentas utilizadas no seu blog, que mais tarde ficou offline.
Conclusão
Não há dúvidas: apesar de jovem, a Treehouse está no bom caminho.
Como se pode ver, há aqui muitas lições que se podem retirar. Estas são as minhas 2 preferidas:
- Qualquer colaborador pode e deve actuar como um mini-CEO na empresa;
- Horas passadas à frente do computador não são sinónimo de output de qualidade.
Espero que mais empresas sigam o exemplo da Treehouse!